sexta-feira, 26 de outubro de 2007

O lago

As margens do lago cabiam no horizonte descampado da pequena aldeia. Para contorná-lo era fácil. Mas poucos se atreviam a entrar. Primeiro, porque era fundo logo no primeiro passo. Depois, tinha algo estranho para quem, com o seu barquinho, tentava atravessá-lo. Algo expulsava sempre os homens. Uma correnteza? Ninguém sabia o que era. Mas, de qualquer início de margem, o intento era frustrado. Os homens remavam, até conseguiam algum caminho, mas a força era tanta que desistiam. Ninguém sabia nada. O fato é que quanto mais se avançava - ninguém conseguia avançar um metro com exatidão - mais a pequena colônia de peixes aumentava. O interesse dos raros pescadores era ultrapassar um pouco esse limite. O impulso era a fome, o sustento das famílias.

Nesses anos todos em que estive sempre a olhar os intentos melancólicos dos pescadores - o meu olhar era também de melancolia - só vi um pescador, que todo dia, logo ao amanhecer, pegava o seu barquinho frouxo, nunca desistir. Ele saia, depois de tanto remar já no fim da noite, com aspecto de glória. Conta a aldeia - eu nunca conseguia olhar o fim de tanto esforço inútil - que os peixes eram sempre os mesmo. Mesmo tamanho, mesmo gosto, mesma espinha. Mas o homem sempre os via maior, e os comia com mais fome e com mais prazer. Os filhos e a mulher mantinham, depois de cada refeição, o aspecto magro. O homem parecia que engordava, se fortalecia.


Não aguentava ver mais o lago, a fome, os pescadores inúteis. Mudei de aldeia. Mas o lago parece não ter me abandonado. Vivo do comércio dos peixes. E a fome e as pessoas que compram esses peixes parecem se assemelhar ainda a tudo da minha aldeia.


Acaba de chegar para os meus olhos um peixe enorme. Tão enorme que ninguém se atreveu a comê-lo. Também não quis vendê-lo. Sabia que tinha sido o homem a pescá-l0. Corri para a aldeia, para o lago. Para a minha surpresa todos os pequenos barcos estavam no centro do lago. Todos os pescadores com os seus grandes peixes. Somente um pescador estava na borda, o Homem. Cansado e velho ele estava deitado dentro de seu barco e carrega junto ao peito um outro peixe. A família e o povoado, famintos, tentaram a todo custo tirar o peixe do colo do homem para comer. E o momento foi fatal. O homem nunca tinha usado tanta força! Morreu!

A aldeia comia tranquila o peixe que sobrava.

Nenhum pescador conseguiu jamais voltar do centro do lago. Ficamos sem saber se tinham medo da fome da aldeia ou se não voltaram porque o lago agora impedia todos de sair de seu centro. De longe, víamos algumas remadas. Mas o que se passava? Morreram todos.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Superfície vibrilínea horizontal da massa aquosa plácida abrigo de seres.